Egoísmo, uma epidemia global

“Tenha um coração que nunca endurece, uma calma que nunca se cansa e um toque que nunca magoa.” Charles Dickens

Lançado em 19 de dezembro de 1843, o clássico “Um conto de Natal”, do romancista inglês Charles Dickens (1812-1870), apresenta um velho avarento, Ebenezer Scrooge. Na véspera de Natal, enquanto conta moedas em seu escritório e reclama de seu assistente, que quer ir pra casa ficar com a família, Scrooge é interpelado por dois cavalheiros que pedem doações de algumas moedas para comprar alimentos para os pobres, ao que responde: “Que morram, então. Ajudarão, ao menos, a evitar o excesso da população” (DICKENS, 2003).

Ebenezer Scrooge, personagem de Charles Dickens. REPRODUÇÃO

O egoísmo, no entanto, não é uma exclusividade da espécie humana; de fato, ele existe e está intrinsecamente ligado à sobrevivência em todos os seres vivos. O biólogo Michael Soulé, professor emérito de estudos ambientais da Universidade da Califórnia, explica:

Todas as criaturas são egocêntricas e egoístas porque, instintivamente, desejam e procuram energia e outros recursos.

Ou seja, o mesmo instinto que faz um cão enterrar o osso para quando sentir fome mais tarde é o que leva alguém a economizar para fazer uma viagem ou comprar algo.

Existem, contudo, dois tipos básicos de avareza: a “benéfica”, que visa assegurar a própria sobrevivência (e a de sua prole), e a “maléfica”, pautada no egoísmo e no orgulho. Esta última, presente apenas no Homo sapiens, possui raízes psicológicas profundas:

“As pessoas têm um desenvolvimento único e pessoal, o que determina sua forma de interagir com o ambiente e dele extrair a segurança necessária” afirma o neurocientista da USP Gilberto Xavier.

Os avarentos sentem necessidade de acumular e guardar, assim como dificuldade para compartilhar. É muito provável que isso tenha relação com a história de vida dessas pessoas, refletindo carências pontuais de acolhimento e afeição.

No livro “Mercados Radicais – Reinventando o Capitalismo e a Democracia para uma Sociedade Justa”, Eric A. Posner, professor na escola de Direito da Universidade de Chicago, e E. Glen Weyl, pesquisador na Microsoft, afirmam que os mercados egoístas dos dois últimos séculos, apesar de todo o progresso econômico, também promoveram atitudes autocentradas e a indiferença ao bem público (POSNER & WEYL, 2019, p. 276):

Alguns estudiosos defendem que os mercados, ao incentivar o egoísmo, corroem a confiança necessária para que eles mesmos funcionem. A concorrência de mercados impessoais de commodities cria associações entre o comércio e a barganha, o poder de mercado e manobras para obter vantagens às custas dos outros no mercado. Os mercados concentram a atenção nos bens privados em detrimento dos bens públicos, fomentando a hostilidade contra ações coletivas.

Créditos e referência:

Figura 1Ebenezer Scrooge

DICKENS, Charles. Um Conto de Natal. L&PM Pocket, 2003.

POSNER, Eric A. & WEYL, E. Glen. Mercados Radicais: Reinventando o Capitalismo e a Democracia para uma Sociedade Justa. Portfolio-Penguin, 2019.

Compartilhe

Share on whatsapp
Share on facebook
Share on linkedin
Share on telegram

Deixe seu comentário

Posts recentes

Embaixador(a) I

R$ 0,00