Luz e Sombra

Por Daniela Garcia, Diretora de Operações do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB) 15/08/2021

Sou uma pessoa otimista e acredito fortemente na capacidade das pessoas em se conscientizar, aprender e evoluir. É fundamental que eu comece meu texto falando isso porque todos os meus argumentos são alicerçados nesta crença de que podemos construir um mundo melhor e mais saudável se formos capazes de entender o impacto que geramos a cada escolha da nossa vida. O otimismo me ajuda a olhar a vida de forma mais iluminada, mas não pensem que confundo luz com ingenuidade. Tenho certeza de que onde há mais luz, existem sombras na mesma medida.

Quando falamos em trabalho, em oportunidades de geração de renda e inclusão no mercado, eu penso imediatamente nisso. Vivemos com muita luz e a mesma quantidade de sombra nesse assunto.
Vamos falar primeiro das sombras.

Somos um dos países com o maior desemprego juvenil do mundo. Segundo dados publicados em maio pelo IBGE, a taxa de desemprego entre os jovens de 14 a 17 anos chegou a 46,3%, o maior percentual da série histórica medida pela instituição.

A alta evasão escolar colabora para que nossos jovens não estejam preparados para acesso ao mercado de trabalho mais especializado e que remunera melhor. Ainda segundo pesquisas, os jovens saem cedo das escolas porque precisam trabalhar (a maioria dos meninos por esta razão) ou para cuidar da casa, dos irmãos e dos idosos (no caso das meninas). Esse fato também já alicerça e estabelece de saída outro problema que é a futura desigualdade de oportunidades para cada gênero.

Em nossas escolas não preparamos os jovens para serem empreendedores. (Aliás, muita gente entende o empreendedorismo como fórmula para criar empresas, quando na verdade é “mindset” e forma de enxergar a vida) e muito menos para o futuro digital que se apresenta agora.

A tecnologia está em tudo e vai ampliar ainda mais a sua presença, substituindo muita de nossa mão de obra produtiva por robôs.
Será que estamos preparando nossos meninos e meninas para esse futuro inovador e audacioso, ou estamos colaborando para que já cheguem desempregados?

Preparamos nossos jovens para um mercado de trabalho cheio de ideias antiquadas onde a produção braçal era mandatória e única forma de viver. Ensinamos mais o que era necessário para uso em linhas de produção do que para mesas de debate. Não preparamos “soft skills” ou habilidades. Preparamos braços, pernas e força bruta. Contratamos por currículo e muitas vezes demitimos por atitude, quando deveria ser ao contrário.

Nos últimos 10 anos surfamos a onda da “gig economy” (conceito em inglês que engloba as formas de emprego alternativo que vão desde a prestação de serviços por aplicativo até freelancers) que nos trouxe as plataformas de compartilhamento e a possibilidade para muitos encontrarem uma nova forma de incrementar suas rendas e turbinar o prato de comida em casa.

Foi também a partir dessa década que mudamos nossa forma de encarar a vida. Passamos a falar em circularidade, compartilhamento e equidade de forma muito diferente. Estes valores passam a se tornar pilares de empresas e alicerce para muitos empreendimentos.

Neste momento, além da vida, o trabalho e o emprego também passam por uma forma de reinterpretação.

Pessoas passam a determinar seu ritmo e suas escolhas; as relações trabalhistas também mudam e o indivíduo é chamado a ser ainda mais consciente de seu papel, da importância da sua autogestão e organização. Evoluímos, na dor e na sombra, mas evoluímos.

Hoje temos trabalho e olhamos o emprego formal se modificar a cada dia.

Para o mercado, o capital intelectual passou a mandar. Empresas mais conscientes do seu papel na sociedade atraem mais talentos e indivíduos mais proativos, retendo-os através de relações humanas mais sólidas e apoiada em humanidade, princípios e valores, além de segurança e espaço de pertencimento.

A pandemia causada pelo Covid-19 veio intensificar ainda mais essas novas relações trabalhistas, e ao mesmo tempo revelar desigualdades emblemáticas brasileiras.

Nossa sombra se ampliou. O número de desempregados subiu enormemente, a desigualdade alcançou limites inimagináveis mostrando muito mais mulheres em casa, perdendo renda e precisando deixar seus empregos para cuidar dos filhos, do que nunca antes foi visto. Milhões de famílias entrando em insegurança alimentar e negócios falindo pela não possibilidade de manter sua mão de obra remota.

Precisamos de Luz!

Grandes empresas entenderam seu papel de exemplo e sua posição no ecossistema do país. Passaram a perceber que fazem parte de um conjunto de grupos envolvidos que participam ativamente do dia a dia do negócio e que sem comprometimento e atenção, não funciona.

Nossos “stakeholders” devem seguir conosco, numa troca diária de valor compartilhado, de atividades e geração de riqueza. Sem eles, não somos ninguém.

Também durante a pandemia os trabalhadores precisaram se reinventar. A tecnologia subsidiou a mudança para o home office e ouso apostar que estejamos passando por uma das grandes viradas de evolução neste planeta. Uma virada de chave onde as relações de trabalho passam a ser ainda mais pautadas pela confiança, pela eficiência e não pela presença física e olho no olho.

Onde há confiança há liberdade, onde há liberdade há autenticidade, entrega e compromisso. Eficiência nasce daí. Resultados também.

Trabalho numa instituição que acredita piamente no protagonismo das empresas em curar as dores da sociedade. De fato, entendemos que as empresas (de qualquer tamanho e de qualquer segmento) têm o poder de transformação em mãos. Elas podem incluir, treinar, educar, melhorar a vida e saúde de todas as pessoas que estão com ela e perto dela. Devolver à sociedade riqueza e oportunidade não é doação. É obrigação.

Pensem em programas de educação corporativa para funcionários. Jovens aprendizes e estagiários sendo preparados para seres líderes. Projetos sociais subsidiados que buscam educar mais e melhor. Programas de reciclagem de lixo e economia circular.

Cuidados com meio ambiente e respeito a natureza alçados a outra categoria. Carbono zero, carbono negativo e cuidados com a água.

Tudo isso já existe, e se expande cada vez mais. Grandes companhias criam a todo instante projetos que ampliam seu território e ganham espaço na sociedade levando impacto positivo ao seu entorno e no planeta. Uma atitude de respeito aos cidadãos e que busca inclusão, equidade e segurança.

Elas também são criadoras de oportunidades reais de acolhimento de jovens. Muitas empresas estão abertas e ávidas a descobrir talentos, lapidar e treinar para o sucesso futuro.

Esse olhar não é só otimista. Ele é possível e urgente.

Essa crença em uma iniciativa privada atuante e íntegra passa por uma renovação da nossa leitura de empresa e de lugar de trabalho.

Precisamos acreditar e incentivar que mais empresas saibam focar em seus propósitos e no valor das relações com seus “stakeholders” e, que com isso entendam suas responsabilidades e seu papel protagonista em diminuir desigualdades, oferecendo e criando um mundo e um futuro melhor para as próximas gerações.
Juntos, empresas e sociedade construirão ambientes mais saudáveis e prósperos para trabalhar, e isso não é uma luz no final do túnel. É uma tremenda lanterna que temos em mãos e que pode fazer toda a diferença.

REPRODUÇÃO

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