A área da saúde no Brasil, representada pelo SUS no setor público ou pelas operadoras de saúde suplementar na iniciativa privada, enfrenta um grande dilema que gira em torno de como ampliar o acesso da população aos mais diferentes recursos de forma economicamente sustentável. Os crescentes custos puxados pela inflação da saúde, sempre superiores à inflação média da economia, os insumos atrelados ao câmbio elevado e as demandas cada vez maiores motivadas pelo envelhecimento da população, tornam a busca do equilíbrio financeiro do setor da saúde um imenso desafio.
Entretanto, vimos na nova economia digital o surgimento de modelos de negócios estruturados em plataformas de assinaturas, que colocam em evidência a chamada “economia compartilhada”. Por meio de aplicativos e tecnologias que permitem escalar sua atuação para um mundo sem fronteiras, novos projetos de compartilhamento de carros, casas, eletrodomésticos e até de serviços são lançados no mercado. Nesta nova configuração de sociedade, prevalece a valorização do acesso em detrimento à posse. Uma nova geração de consumidores, mais consciente quanto às responsabilidades socioambientais, desperta para uma comunidade mais equânime.
Neste contexto, denominado economia colaborativa ou compartilhada, três pontos se destacam como fatores críticos para que tal modelo se viabilize, são eles:
- A redução do estoque excedente e da capacidade ociosa, que contribui para otimização dos recursos já produzidos e auxilia a sustentabilidade do sistema;
- Projetos que sejam escaláveis por meio de plataformas estruturadas tecnologicamente;
- Projetos que inspiram o engajamento da sociedade por conta do seu impacto positivo e que sejam totalmente baseados em uma relação transparente entre ofertante e demandante.
Na área da saúde, algumas iniciativas surgem baseadas neste conceito de economia colaborativa. Clínicas populares, cartões de desconto com uma rede de especialistas, oferta de exames e consultas e plataformas de leilão reverso que visam baratear o custo de compra de produtos, já são realidades em nosso ambiente. Mas será que é suficiente para conseguirmos reduzir a lacuna de acesso aos recursos àqueles pacientes que mais precisam? Será que conseguiremos, de fato, incluir novos consumidores no mercado e, ao mesmo tempo, atenuar o impacto no orçamento dos gestores públicos e privados, já tão espremidos? Associado a tudo isso, conseguiremos ampliar acesso de forma sustentável economicamente e ambientalmente?
Dados do Ministério da Saúde demonstram que há em torno de 60 milhões de brasileiros com alguma restrição de acesso ao sistema, seja pelo desconhecimento da jornada a ser cumprida para chegar aos recursos, seja pela indisponibilidade do bem ou, ainda, por dificuldades financeiras. Por outro lado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima uma perda de recursos da saúde em torno de 20% a 40%, por conta do desperdício. O estudo da OMS revela, também, que mais de 50% de todos os medicamentos são incorretamente prescritos, dispensados ou vendidos e em torno de 10% dos que são produzidos acabam vencendo sem serem utilizados.
Essa dicotomia de pessoas necessitadas sem acesso de um lado e, do outro, estoque excedente e desperdício elevado, gera a possibilidade de repensarmos novos modelos de consumo e oferta na saúde e que não considerem simplesmente o desenvolvimento, a incorporação e a disponibilização de novas tecnologias. Um despertar para projetos que contemplem a responsabilidade econômica e social tão necessária para uma cobertura universal e de forma sustentável ao sistema é o desafio proposto para todos os players do setor. A saúde não espera!
Convido a todos para pensarem na construção de um ambiente mais colaborativo e compartilhado dentro da saúde.
Carlos Pappini Jr. é Founder e membro do Conselho de Administração do Instituto Colabora Saúde.
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