Os índices de meio ambiente, social e governança (ESG) têm desempenhado um papel crucial no alinhamento entre as empresas e o mercado financeiro, facilitando a comunicação eficiente de performances ESG. Mas como a gestão de riscos e a tomada de decisão baseada nesses índices podem ajudar as empresas a atrair mais investidores e orientar os investidores em suas decisões?
O principal negócio das empresas hoje, em tempos de ESG, em especial as empresas de capital aberto, é gerar performance com princípios. Para que isso ocorra, é necessária uma estrutura sólida de governança que tem como um de seus principais pilares a gestão de riscos. Levar clareza aos investidores é um grande desafio, mas é possível e os indicadores podem ser um bom caminho. O processo de análise no mercado financeiro das companhias se pauta nas ações das empresas, que são baseadas nos indicadores publicados pelas corporações.
Por isso, os indicadores ESG passaram a constituir a visão de performance com princípios da companhia em análise.
Do lado das empresas, gerir riscos eficientemente se pauta em analisar e antecipar cenários que impactarão os resultados das companhias no curto, médio e longo prazo. Riscos ESG estão entre os mais novos e dinâmicos deles, como questões ligadas à matriz energética, força de trabalho e ações de anticorrupção, transações internacionais (câmbio, regulações), dentre outras.
Em uma visão de riscos corporativo, na alta gestão, poderíamos acrescentar oito riscos como objeto de análises e criação de indicadores, sendo eles: Composição da força de trabalho (etarismo, gênero, competência, dentre outros); transição energética (matriz e pegadas); riscos climáticos/financeiros; riscos das demonstrações financeiras; deterioração do ambiente geopolítico; riscos tecnológicos (transformação digital, segurança da informação); riscos da cadeia de suprimentos e riscos sistêmicos (pandemia, dentre outros).
Do lado do mercado financeiro, o movimento não é diferente. Com um volume expressivo de atração de investimentos, atingindo em torno de 2,5 trilhões de dólares direcionados para fundos ESG em 2022, segundo o CFA Institute, os analistas devem estar atualizados quanto às demandas do mercado. Compreender os impactos nos investimentos e a rentabilidade das companhias, ou como representam esses aspectos nos indicadores apresentados, é fundamental para o processo de análise de investimentos.
O tema ESG e atração de investimentos rendeu índices específicos mundo afora, estando hoje presente em 135 países, segundo o Global ESG Index 2021, nos quais empresas são colocadas em patamares com seus pares e setores em uma espécie de comparação sobre os avanços dos indicadores atrelados às agendas ESG. E mais, o assunto é mais antigo do que se imagina. Neste ano, o icônico benchmarking mundial de índices ESG o Dow Jones Sustainability Index completará 24 anos de existência. Nos últimos anos, a indústria financeira ESG cresceu muito, potencializando o processo de inputs de indicadores ESG na gestão das grandes empresas.
Mas se ESG é tão promissor assim, por que empresas e mercado ainda encontram dificuldades na hora dos investimentos?
Surge nessa questão um dos maiores desafios para os dois lados: a padronização para a compreensão dos resultados. ESG é um processo que está acontecendo, trata-se de um processo contextual, ou seja, que se relaciona com a realidade das empresas considerando seu setor e localização geográfica de atuação. Sendo assim, é muito normal e eficiente encontrar processos de reestruturação e melhorias contínuas. Isso mesmo: daqui para frente, não existe fim, mas continuação, transformação. E a questão da padronização e interpretação dos indicadores tem sido um importante ponto de fricção para destravar os investimentos.
Empresas e mercado financeiro por vezes ainda não falam a mesma língua para o ESG e é exatamente nesse contexto que os índices ganham muita relevância, por conseguirem alinhar a comunicação dos indicadores para o mesmo nível de compreensão de mercado. Os assessments (questionários) que as empresas respondem para poderem fazer parte de algum índice já compõem questões que, por si, poderiam ser um guia de estruturação de governança, riscos e compliance para as organizações. Estruturados sob a vanguarda de pesquisas e estudos na área, esses assessments reúnem o melhor que podem oferecer em termos de visibilidade de práticas, políticas e investimentos que rondam a esfera ESG, ao mesmo tempo em que buscam levar aos investidores as informações mais relevantes para a sustentabilidade dos negócios.
O papel dos índices ESG na Comunicação Empresarial e na tomada de decisão de investimento
Os índices ESG fornecem uma estrutura para as empresas divulgarem informações importantes de maneira padronizada e facilmente compreensível, assim garantindo que são capazes de expressar claramente o nível de seu compromisso com os princípios da sustentabilidade, justiça social e boa governança. Esse compromisso é importante não apenas para atrair investidores conscientes sobre os aspectos ESG, mas também para proteger a reputação da empresa e assegurar a confiança dos stakeholders.
Além disso, os índices ESG procuram fornecer aos investidores uma visão clara e objetiva da performance de boas práticas de uma empresa. Essas informações permitem que os investidores incorporem considerações ESG em suas decisões de investimento, ajudando-os a identificar empresas que estejam alinhadas com seus valores e expectativas. Por meio do uso desses índices, os investidores podem diversificar seus portfólios para incluir empresas que demonstram responsabilidade ESG, mitigando potenciais riscos e contribuindo para uma economia mais sustentável. Naturalmente, esses índices estão em constante evolução, mas são um bom caminho que já carregam consigo uma certa estrutura.
Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3) como precursor
O ISE da B3 é um bom exemplo. Um dos índices mais antigos do mundo, criado há quase duas décadas, surgiu com o objetivo de ser uma referência robusta de registro e compartilhamento do fundamento do que estamos vivendo em termos de sustentabilidade, buscando ser o indutor de boas práticas de responsabilidade provocadas por agentes do mercado, além de instigar as empresas a seguir uma agenda de responsabilidade corporativa sustentável.
Na estruturação de seu questionário, o ISE B3 traduz o mundo em que vivemos: um momento histórico de transição do seu modelo de produção, consumo e capitalização. Como saber se empresas estão se adaptando? Esse é o ponto mais alto de dificuldade sobre a compreensão das práticas ESG nas empresas, por parte dos investidores. Essa questão é inerente a qualquer índice e reflete na busca por saber o quanto a empresa está contribuindo em impacto e financeiramente neste cenário inevitável de transição para um novo paradigma de produção e consumo.
Vale ressaltar que o ISE também oferece uma medida quantitativa do desempenho ESG de uma empresa, permitindo a comunicação eficaz e transparente dos esforços de sustentabilidade de uma empresa aos seus investidores.
Isto significa que medir a sustentabilidade é calcular o quanto a empresa contribui para essa transição (“materialidade de impacto”) e entender em que magnitude aufere vantagens ao ser parte integrante e aderente deste novo cenário (materialidade financeira).
Para cumprir tal objetivo, o olhar sob o qual o ISE B3 foi construído busca trazer uma visão holística da existência de práticas, políticas e processos. Sendo assim, o conceito da dupla materialidade esteve presente desde o seu início até os dias atuais. Considerado o olhar mais completo, dado pela atualidade, a dupla materialidade busca trazer o duplo impacto —financeiros e não financeiros —, colocando as duas materialidades com prioridades de igual importância. Dessa forma, as correlações poderão ser feitas de forma mais coerente e precisa.
Assume-se assim que, se uma empresa tem boas práticas, boas políticas e processos bem estabelecidos, ela trará bons resultados e impactos positivos para a organização e para os seus stakeholders. Por conseguinte, o ISE B3 endereça a complexidade da sustentabilidade e de práticas ESG ao assumir uma carteira mostrando o arcabouço das empresas que o compõem e dando visibilidade sobre seus resultados, de forma que os investidores tenham acesso a dados que os permitam tomar decisões e desenvolver estratégias de investimento.
Como um dos resultados, as empresas elencadas no ISE apresentam uma menor volatilidade quando comparadas às empresas listadas no índice B3. Desde que foi criado, em 2005, o ISE B3 apresentou performance de 267,06% contra 228,42% do Ibovespa (base de fechamento em 30/12/2021). Em dezembro de 2021, o ISE B3 ainda teve ainda menor volatilidade: 16,72% em relação a 19,71% do Ibovespa (fonte:b3).
Implicações práticas
Na prática, os gestores das empresas devem considerar os índices ESG como parte integrante de sua estratégia de comunicação. Isso envolve a identificação de iniciativas relevantes de ESG e a implementação de medidas para melhorar o desempenho nessas áreas.
Independentemente do nível em que se encontram nessa agenda, deve ser encarado pela alta gestão e ser desenvolvido, até porque, em um curto espaço de tempo as empresas que não foram aderentes às boas práticas ESG terão destaque negativo, afetando a sua imagem, seus retornos e a sua atração por investimentos.
O fato de a empresa ter como objetivo estar dentro de um índice ESG garantirá um desenvolvimento sustentável em práticas e políticas que, sem dúvidas, aprimoram a gestão e solidificam os objetivos estratégicos e seus resultados no médio e longo prazo.
Autores:
Claudinei Elias é Fundador da Bravo GRC, com vasta experiência em GRC (Governança, Riscos e Compliance), ESG (Ecoambiental, Social e Governança) e ERM (Gestão de Riscos Corporativos). Possui formação em alta gestão para liderança na Yale School of Management e Pós-MBA em Tecnologia e Liderança pela Saint Paul Escola de Negócios, além de certificações especializadas em Harvard, Cambridge, AIRM, Babson College, University of Glasgow, Saint Paul/IBM e Programa SEER.
Suelen Silva é Head de Research da Bravo GRC. Mestre em Estratégia Empresarial pela FGV EAESP, inovadora e analítica, com visão sistêmica de negócios e de pessoas. Atua como Head da Bravo Research trazendo insights estratégicos e provocações para melhores práticas de governança, gestão de riscos e ESG nas organizações.