O pirlimpimpim do propósito

Vivemos a era do “propósito”. Antes de qualquer coisa, que bom! Ter clareza de propósito é uma benção nos ambientes instáveis. O propósito pode funcionar como uma bússola na avalanche das oportunidades que surgem ou nos desafios que se apresentam a todo momento. No entanto, nem todas as oportunidades são adequadas para nós. E nem todos os desafios devemos encarar. Não seria a estratégia que deveria definir qual oportunidade aproveitar e qual desafio escolher? Sim! Mas, e se estas escolhas partissem do crivo inicial do alinhamento com o propósito, o filtro da estratégia não tenderia a ser mais efetivo, reduzindo as chances de erro nas escolhas?

Vivemos a era do “propósito”, mas às vezes parece que todos querem ter um propósito para chamar de seu, como se fosse um souvenir. E não se trata disto. Ter um propósito não pode ser moda, muito menos marketing. Nem cumprimento de check-list de consultoria. Nem tem como nascer em um workshop de seis horas. Não caia nesta armadilha! Propósito é como aço temperado a ferro e fogo, que nasce junto com a organização, alojado no ideal do fundador. Por isso, muito cuidado nesta jornada do propósito. Ele não deve ser buscado ou desejado. Apenas descoberto, pois deve existir desde o primeiro dia da empresa, mas talvez esteja esquecido ou escondido do coração do fundador.

Ter propósito é saudável, talvez até necessário para os tempos BANI (acrônimo formado pelas palavras brittle, anxious, nonlinear e incomprehensible – em português, frágil, ansioso, não-linear e incompreensível) que vivemos. Mas afirmo que o propósito por si só não faz a mágica. O propósito é o elemento para a mágica, mas não é a mágica em si. O que transforma a frase bonita na parede da organização em efetividade é a coerência e a constância. Estas duas palavrinhas são o pirlimpimpim que convertem o propósito em algo transformador.

Ser coerente com o propósito é cumprir o que promete. É agir como fala. É o walk the talk. Constância no propósito, firmeza em relação às nossas crenças e, mesmo nas adversidades ou nas tentações do mercado, manter-se firme no caminho. Quando coerência e constância fazem parte da cultura da organização, o propósito é potencializado e adquire o superpoder que se credita a ele. A mágica acontece!

Propósito sem coerência é fraco e não resiste às intempéries do mundo dos negócios. Propósito sem constância é sem caráter e não sustenta seu discurso além da página 2. A coerência e a constância é que dão vida ao propósito, dão verdade à inspiração do propósito. É quem materializa o que o propósito promete. Propósito é o elixir da vida da empresa, pois é ele que sustenta uma organização no longo prazo. O propósito é que dá sentido a uma estratégia, é ele que impulsiona a performance, que faz a empresa evoluir sua consciência e não somente crescer números. 

E, acredite, será nas crises que ter um propósito fará toda a diferença, pois funcionará como um farol que ilumina as decisões na escuridão que transformam os cenários adversos. Vimos isto na pandemia, e vimos novamente nas cheias de maio deste ano. Sua organização, que tem um belo propósito, como se comportou nestes dois ambientes? Cresceu, reteve talentos, ampliou a admiração pela sua marca? Ou teve sérias dificuldades e precisou entrar no modo sobrevivência? Tenho convicção de que as empresas orientadas por um propósito genuíno, coerente com seu discurso e constante em suas ações, souberam melhor que decisões tomar e saíram destas crises melhores do que entraram.

Propósitos verdadeiros precisam passar pelo teste da coerência e constância. Só depois deveriam ser exibidos em cartazes e posts nas redes sociais e estarem aptos para acelerarem toda uma organização para um mesmo sentido. Pior que não ter um propósito é ter um propósito que não é seguido ou que não transpira verdade.


Autor

Solon Stapassola Stahl, conselheiro da Filial Regional do Capitalismo Consciente no Rio Grande do Sul

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