A água — e principalmente a falta dela — é um tema recorrente. Está nos debates escolares, nos noticiários e, em casos extremos, nas torneiras secas de algumas grandes cidades do mundo. Na nossa vida cotidiana, sua presença é marcante: afinal, 70% do nosso corpo é água. Nossa atenção só é chamada para ela, justamente, quando falta. Ou, então, quando ela vem em excesso, em catástrofes climáticas cada vez mais comuns.
Eventos extremos têm se repetido. Em 2014, a crise hídrica vivida pelo Estado mais rico do país, São Paulo, causou comoção. Expressões como “volume morto”, desconhecidas para a maioria das pessoas, passaram a fazer parte dos diálogos cotidianos. Já no Rio Grande do Sul, em 2022, 425 municípios decretaram situação de emergência, e a previsão é de uma quebra recorde na safra de grãos.
Após viver uma sucessão de grandes secas, a Califórnia, nos Estados Unidos, resolveu agir. A frase do então governador, Jerry Brown, proferida em 2014, é sintomática: “O governo não pode fazer chover, mas pode administrar o uso da água.” Após a sentença, o estado se tornou referência na gestão da crise hídrica. Ainda assim, é importante salientar: o investimento é na redução de danos, pois a seca persiste.
O extremo oposto também faz parte da vida das nossas cidades. Minas Gerais teve, em 2022, chuvas de mais de 200 mm em um único dia — o que corresponde a dois meses, considerando a média anual. Eventos extremos comuns a diferentes regiões, que colocam a natureza e a água, por alguns momentos, no centro do debate público. Infelizmente, no entanto, esse debate, na maioria das vezes, não resulta em ações efetivas e duradouras.
Bons exemplos existem
Se o debate em torno da água é, em grande parte, raso e restrito aos momentos de grandes crises, algumas iniciativas apontam para um futuro melhor. O Grupo Heineken, por exemplo, assumiu o compromisso, por meio do seu programa Every Drop, de até 2030:
- Retribuir integralmente para a bacia hidrográfica cada litro de água utilizado nos seus produtos em áreas onde há stress hídrico. A cervejaria se engaja a trabalhar em colaboração com os outros usuários da bacia hidrográfica para a sua preservação, essencial para o bem-estar das comunidades do entorno.
- Maximizar a circularidade em áreas de stress hídrico por meio de recuperação, reuso e reciclagem, e o tratamento de 100% de suas águas residuais no mundo.
- Reduzir o uso de água para uma média de 2,8 hectolitros de água para cada hectolitro de produto (atual 3,2 hl/hl) em áreas de stress hídrico, e 3,2 hl/hl (atual 3,5 hl/hl) em média para todas suas instalações no mundo.
No Brasil, boas iniciativas também chamam a atenção. O programa Novo Rio Pinheiros tem o objetivo de revitalizar esse importante símbolo da cidade de São Paulo, através da ação de diversos órgãos públicos em parceria com a sociedade. A meta até o fim de 2022 é reduzir o esgoto lançado em seus afluentes, melhorar a qualidade das águas e integrá-lo completamente à cidade. Por ser um rio urbano, a água não será potável. No entanto, com o projeto de despoluição concluído, haverá a melhora do odor existente, abrigo de vida aquática e, principalmente, a volta da população às suas margens, por meio também da recuperação ambiental e paisagística do seu entorno.
Já a Coalizão pelas Águas está focada em solucionar os complexos desafios de conservação da Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica, levando em conta a importância da biodiversidade e o sequestro de carbono destes biomas e o potencial de implementação e geração de impacto. Além de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba e Vitória, o Vale do Araguaia e o estado do Pará são os locais estrategicamente selecionados para essa nova fase, por permitirem ganho de escala de ações duradouras.
Unindo os esforços da The Nature Conservancy (TNC), do setor privado e público e da população, a Coalizão pelas Águas busca implementar soluções baseadas na natureza, conservando e recuperando florestas e almejando equilibrar algo que, nos dias de hoje, é irregular: a oferta e a demanda da água.
Essas e outras tantas iniciativas mostram que é possível ter um impacto positivo na natureza. Elas sozinhas, no entanto, não bastam. É preciso que os mais variados setores se comprometam com a sustentabilidade do planeta. Cada um pode contribuir para um uso mais racional da água:
- Na agricultura, o uso de tecnologias de irrigação desenvolvidas e utilizadas em países de stress hídrico, associado a um uso mais racional de fertilizantes menos tóxicos, permitirão um substancial diminuição da utilização de água pelo agrobusiness, assim como uma forte redução da poluição dos lençóis freáticos.
- Na indústria, as oportunidades de redução de consumo se encontram nas melhorias e inovações nos processos industriais, envolvendo recuperação, reciclagem e reutilização das águas de processo.
- No uso residencial a redução de consumo, se dá com a mudança de hábitos de consumo, sem desperdício, e a instalação de equipamentos hidráulicos com consumo mais baixo. Além do uso racional pela população, os prestadores de serviços de água e esgoto devem implementar os métodos e tecnologias que permitam a operação dos sistemas de abastecimento de água com níveis de perdas aceitáveis.