Davos 2024: Reconstruindo a Confiança Global em Meio a Desafios Geopolíticos

Entre os dias 15 e 19 de janeiro, o mundo viu o desenrolar da 54ª Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. Sob o sugestivo tema “Reconstruindo a Confiança”, o evento foi palco de mais de 200 sessões protagonizadas por influentes figuras públicas, para abordar temas urgentes que permeiam a atual realidade global.

Com um contexto geopolítico tenso, a reunião de Davos deu vazão a debates sobre os conflitos que continuam a lançar sombras sobre a paz e a estabilidade globais, enquanto a fragmentação política, que afeta áreas tão diversas quanto a crise climática e o desenvolvimento tecnológico, demanda uma resposta coletiva.

Mais de 60 chefes de estado e de governo, acompanhados por cerca de 300 ministros e líderes políticos, participaram ativamente de palestras e discursos especiais, trazendo consigo perspectivas únicas sobre a reconstrução da confiança global.

Em seu discurso de abertura, Klaus Schwab, fundador e presidente-executivo do Fórum Econômico Mundial, destacou os desafios profundos que a humanidade enfrenta atualmente e falou sobre o papel do Fórum de analisar sistemicamente o estado do mundo e encontrar soluções impactantes. 

Schwab abordou a interconexão geopolítica, o crescimento econômico desigual, as ameaças ambientais das mudanças climáticas e os riscos tecnológicos. Além disso, expressou preocupação com a reação reativa a esses desafios, enfatizando a necessidade de uma mudança de paradigma e reconstrução da confiança:

“Devemos reconstruir a confiança – confiança no nosso futuro, confiança na nossa capacidade de superar desafios e, o mais importante, confiança uns nos outros.”

O presidente-executivo também destacou a importância da tutela, convidando líderes governamentais, empresariais e sociais a assumirem a responsabilidade de administrar um futuro melhor. Ele enfatizou que a confiança é essencial para a cooperação e o funcionamento eficaz das instituições. Por fim, fez um apelo para reconstruir a confiança através do compromisso coletivo em iniciativas que abordam os principais desafios globais.

Na mesma linha, António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas (ONU), utilizou o seu discurso especial para pedir aos países que superem divisões geopolíticas em prol de soluções globais. E destacou a urgência de agir diante do caos climático e do desenvolvimento desenfreado da Inteligência Artificial (IA) sem barreiras de proteção. 

O Secretário-Geral da ONU expressou preocupação com a instabilidade política crescente, que alimenta a insegurança econômica e citou dados da Oxfam sobre o aumento das fortunas dos mais ricos em contraste com o empobrecimento de bilhões:

“Os cinco homens mais ricos do mundo mais do que duplicaram as suas fortunas desde 2020 – a uma taxa de 14 milhões de dólares por hora. Ao mesmo tempo, mais da metade do mundo se tornou mais pobre. O Banco Mundial alerta que estamos caminhando para a pior meia década de crescimento em 30 anos.”

Por fim, Guterres reiterou que a reconstrução da confiança não é apenas um slogan, mas uma necessidade urgente. Ele instou os líderes a utilizarem sua influência para evitar mais danos e colocar o mundo de volta ao caminho da segurança, prosperidade e paz.

Caminhos Inovadores para Cooperação Global em Meio a Desafios Geopolíticos

Em meio a turbulências geopolíticas, conflitos em várias regiões e um aumento recorde de pessoas deslocadas em 2023, o Fórum Econômico Mundial de 2024 reuniu especialistas do seu Conselho de Futuros Globais sobre Geopolítica para proporem soluções de cooperação global, divulgados no atual relatório “Moldando a Cooperação num Mundo Fragmentado”, que oferece caminhos inovadores para maior cooperação global em quatro áreas: segurança global, ação climática, tecnologia emergente e comércio internacional. Confira os principais insights de cada um deles:

Segurança Global – Colaboração em Tempos de Desconfiança

Os especialistas destacam a desconfiança como característica intrínseca da realidade geopolítica e propõem a criação de um mecanismo permanente que conecte grandes e médias potências ocidentais e não-ocidentais para fomentar a diplomacia silenciosa e prevenir conflitos. De acordo com eles, as “potências médias” têm um importante papel na prevenção de conflitos.

Alterações Climáticas – Repensando a Governança Climática

É preciso repensar a governança climática global, considerando o desequilíbrio entre emissões históricas e futuras. Os especialistas propõem a ampliação do investimento privado no Sul Global, incluindo adaptação e a realocação do setor de start-ups em direção aos objetivos climáticos. Eles ainda chamam a atenção para a importância de fóruns multilaterais reconhecerem e diferenciarem os impactos das alterações climáticas em todos os gêneros.

Tecnologia Emergente – Domando a Tecnologia em Conjunto

Destacando o rápido avanço das tecnologias de fronteira e a necessidade de uma abordagem inovadora na regulamentação tecnológica, os especialistas propõem uma obrigação regulamentar semelhante ao princípio da responsabilidade de proteger (R2P) para proteger civis dos danos das tecnologias emergentes. Eles ainda sugerem a criação de uma conferência permanente para tecnologias futuras, semelhante à COP, para negociações sobre alterações climáticas.

Comércio Internacional – Expansão e Reequilíbrio

Os especialistas argumentam que o fortalecimento do sistema comercial exige a expansão da agenda para se alinhar com as prioridades nacionais e globais. Eles destacam a importância de incluir o Sul Global e os países menos desenvolvidos nas oportunidades criadas pelas mudanças nas cadeias de valor globais, e enfatizam que o comércio concebido para concretizar prioridades partilhadas ganhará a confiança dos governos e cidadãos. Enfim, a inclusão emerge como um fator primordial para melhorar a cooperação global, enfrentando desafios na segurança global, alterações climáticas, tecnologia emergente e comércio internacional. O relatório destaca caminhos inovadores para construir uma cooperação mais eficaz em meio a um mundo fragmentado.

Confira os destaques do Fórum Econômico Mundial

16 de janeiro – Urgência na colaboração global para enfrentar desafios complexos

A 24ª edição do Fórum Econômico Mundial em Davos iniciou com um apelo à cooperação global diante dos diversos e profundos desafios enfrentados pelo mundo, conforme destacado pelo professor Klaus Schwab, fundador e presidente-executivo do Fórum. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, enfatizou a necessidade de impulsionar a colaboração global, com a Europa desempenhando um papel único nesse cenário. O conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan, também ressaltou a importância da colaboração e cooperação para alcançar a paz e segurança globais, instando a união e tomada de decisões sábias e ousadas.

A complexidade do cenário geopolítico e geoeconômico foi discutida pelo presidente do Fórum Econômico Mundial, Børge Brende, que sublinhou a necessidade de unidade face a desafios e tensões, como os conflitos em Gaza e a agressão russa na Ucrânia. A proposta de uma cúpula global para promover a paz, anunciada pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy, foi destacada. Na abordagem da economia global, líderes como o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, falaram sobre a necessidade de alinhamento e colaboração em áreas como governança econômica e sistema comercial multilateral. A importância de garantir o crescimento econômico sem comprometer a equidade social e a proteção ambiental foi ressaltada por diversos líderes, incluindo o primeiro-ministro do Vietnã, Pham Minh Chinh.

A impactante influência da inteligência artificial foi reconhecida, com discussões sobre a necessidade de requalificação e governança responsável. O equilíbrio entre inovação e regulamentação foi enfatizado, destacando a importância da segurança cibernética na era da IA. A sessão sobre sistemas energéticos deu foco aos desafios significativos no fornecimento de energia e a necessidade de uma transição energética equitativa e sustentável. O trabalho em curso na China para construir sistemas energéticos do futuro foi destacado, com ênfase na eficiência energética como um componente vital para benefícios econômicos e segurança energética. A conexão entre alterações climáticas, saúde e a tecnologia na descarbonização de indústrias desafiadoras foi explorada nas sessões, evidenciando a ação global para combater e limitar as mudanças climáticas.

17 de janeiro – Um Chamado à Reforma na Governança Global

O secretário-geral da ONU, António Guterres, enfatizou a necessidade de reformas na governança global e alertou sobre a inadequação do sistema atual frente aos desafios contemporâneos. Guterres propôs um “multilateralismo reformado, inclusivo e em rede” para superar divisões geopolíticas e abordar questões críticas, como mudanças climáticas e inteligência artificial. A importância da representatividade do Sul Global nesses modelos de governança foi ressaltada, sendo um ponto central discutido na sessão do Cisma Norte-Sul. Líderes latino-americanos também destacaram a necessidade de envolvimento da região na resolução de desafios globais. A abordagem do secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, foi focada na importância de parcerias e cooperação globais, referindo-se a isso como “geometria variável”. A situação no Oriente Médio foi discutida ao longo do evento, explorando a complexidade e os potenciais efeitos colaterais. A questão das habilidades e empregos emergiu em diversas conversas com o presidente francês Emmanuel Macron, apelando à criação de empregos para apoiar a transição verde e a importância de uma mão de obra qualificada.

As perspectivas econômicas incertas para 2024 foram abordadas por Guterres, que alertou para o risco das divisões geopolíticas para o crescimento econômico. O apelo por um novo modelo de crescimento, alinhado com sustentabilidade ambiental, foi destacado pelo primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez. A colaboração e discussão foram enfatizadas como ferramentas essenciais para revitalizar o crescimento, com otimismo sobre o papel do livre-comérciono crescimento econômico, conforme destacado pelo presidente da Argentina, Javier Milei. Os desafios interconectados, como as mudanças climáticas, foram discutidos ao longo da semana, com líderes como o presidente do Banco Mundial, Ajay Banga, enfatizando a necessidade de uma resposta sistêmica. A colaboração, cooperação e responsabilidade foram ressaltadas como fundamentais para enfrentar a crise climática e promover a transformação econômica sustentável.

18 de janeiro – Segurança, IA e Transição Energética para Enfrentar Desafios Globais

Líderes globais debateram temas como segurança, inteligência artificial (IA) e a transição energética para combater as mudanças climáticas. O presidente israelita, Isaac Herzog, e Mohammad Mustafa, presidente do Fundo de Investimento da Palestina, expressaram suas perspectivas sobre o conflito em Gaza, destacando a necessidade de apoio internacional e soluções políticas. Mais de 60 chefes de estado participaram, enfatizando a importância da colaboração global. Demeke Mekonnen Hassen, vice-primeiro-ministro da Etiópia, sublinhou a necessidade de vozes africanas no cenário global.

A desinformação foi abordada como um desafio à segurança global, e a importância da verdade foi destacada por Vera Jourová, vice-presidente da Comissão Europeia. A regulamentação da IA foi discutida com o chanceler do Tesouro do Reino Unido, Jeremy Hunt, apelando a uma regulamentação “leve” e colaboração global para garantir seu uso ético e distribuição equitativa de benefícios. A urgência da transição energética foi enfatizada em várias sessões, destacando obstáculos regulatórios e a necessidade de financiamento diversificado. A presidente e CEO da Novozymes, Ester Baiget, ressaltou a importância do cenário regulatório na promoção da sustentabilidade.

O comércio foi apontado como impulsionador do crescimento econômico pela diretora-geral da Organização Mundial do Comércio, Ngozi Okonjo-Iweala, que apontou a interconexão entre crescimento e comércio. No entanto, a instabilidade geopolítica foi reconhecida como um risco para as cadeias de abastecimento e o comércio internacional.

19  de janeiro – Enfrentando Desafios Emergentes e Moldando o Futuro Econômico

À medida que o mundo enfrenta mudanças significativas nas condições geopolíticas, tecnológicas, demográficas e ambientais, líderes globais discutem estratégias e abordagens para enfrentar riscos emergentes e choques rápidos. A comissária para Infraestruturas, Energia e Digitalização da Comissão da União Africana, Amani Abou-Zeid, a secretária-geral da Amnistia Internacional, Agnes Callamard, e outros especialistas, incluindo Andrew McAfee, do MIT, e Douglas Peterson, da S&P Global, participaram do diálogo que abordou a volatilidade crescente no cenário de riscos globais e a destruição de décadas de investimento na resiliência humana e institucional. 

Com a economia global em uma encruzilhada, líderes como Ngozi Okonjo-Iweala, diretora-Geral da OMC, Christine Lagarde, presidente do BCE, e outros discutiram os compromissos e dilemas enfrentados pelos decisores políticos na busca por crescimento sustentável. Mohammed Al-Jadaan, ministro das Finanças da Arábia Saudita, enfatizou a importância de políticas de médio prazo para impulsionar o crescimento, enquanto Okonjo-Iweala viu a remodelação das cadeias de abastecimento como uma oportunidade.

Christian Lindner, ministro Federal das Finanças da Alemanha, falou sobre um “novo normal” para o crescimento e resiliência na Alemanha, destacando a reinvenção da infraestrutura nos últimos dezoito meses. Lagarde abordou a transição do consumo e comércio da normalização para a “não normalidade”. O valor do comércio verde foi destacado, triplicando para 1,9 trilhão de dólares, conforme ressaltado por Okonjo-Iweala. 

Relatórios que você precisa conhecer

Relatório de Riscos Globais 2024

Em parceria com Marsh McLennan e Zurich Insurance Group, o Relatório de Riscos Globais destaca as conclusões da Pesquisa Anual de Percepção de Riscos Globais do Fórum, que reúne respostas de 1.500 líderes globais e explora alguns dos riscos mais graves que poderemos enfrentar na próxima década, num contexto de rápidas mudanças tecnológicas, incerteza económica, um planeta em aquecimento e conflitos. À medida que a cooperação fica sob pressão, as economias e sociedades enfraquecidas poderão necessitar apenas de um pequeno choque para ultrapassar o ponto de viragem da resiliência.

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Relatório sobre o futuro do crescimento 2024

O Relatório sobre o Futuro do Crescimento 2024 introduz um quadro multidimensional para avaliar a qualidade do crescimento econômico em 107 países a nível mundial. Caracteriza o crescimento econômico das nações em quatro dimensões: Inovação, Inclusão, Sustentabilidade, e Resiliência. Os dados e análises apresentados podem ser utilizados por uma vasta gama de partes interessadas para identificar áreas a melhorar, soluções de compromisso a resolver ou sinergias a explorar. Embora cada país tenha uma trajetória de crescimento única, moldada por uma vasta gama de fatores circunstanciais, o relatório destaca sete “arquétipos de trajetórias de crescimento” distintos, com o objetivo de identificar os países mais estreitamente relacionados às suas características de crescimento e que enfrentam restrições e oportunidades semelhantes.

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Perspectivas dos economistas-chefes: janeiro de 2024

As Perspectivas dos Economistas-Chefes de Janeiro de 2024 exploram as principais tendências no ambiente econômico, incluindo as perspectivas de crescimento e inflação, e as implicações dos recentes desenvolvimentos geopolíticos, da política industrial e da IA. Esta série de relatórios se baseia nas perspectivas individuais e colectivas de um grupo de economistas-chefes líderes através de consultas com a Comunidade de Economistas-Chefes do Fórum Económico Mundial e de um Inquérito regular aos Economistas-Chefes.

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Fontes

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/davos-2024-special-address-by-klaus-schwab-founder-and-executive-chairman-world-economic-forum/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/heads-of-state-davos-2024-wef-politics/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/pathways-cooperation-geopolitical-fragmentation/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/davos-2024-day-2-highlights/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/davos-2024-day-3-highlights/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/davos-2024-day-4-highlights/

https://www.weforum.org/agenda/2024/01/davos-2024-day-5-what-to-expect-sessions/

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