Found Family: a transformação dos valores através da criatividade e da inclusão

Durante o IX Encontro Nacional de Estudos do Consumo (ESPM), eu tive a oportunidade de apresentar a campanha “Found Family” (Família Escolhida), criada pela marca Converse – 2022, como um exemplo de como a criatividade pode ser uma ferramenta de mudanças de valores, de culturas degenerativas (medo) para culturas regenerativas (amor). A iniciativa da marca foi fazer uma releitura sobre o significado de família em uma parceria com a comunidade LGBTQIA +, incluindo a Converse All Stars, funcionários da Converse e alguns jovens LGBTQIA +.  

Found  Family conta as histórias de vida, a partir das narrativas e valores deste grupo, por meio da criatividade – arte e fotografia – do artista Richie Shazam. E revelou que, para este grupo, a família é aquela formada por pessoas, não necessariamente relacionadas por sangue, mas de diferentes origens, culturas, idades, etnias etc. que se comprometem umas com as outras, conectando-se por meio de experiências e perspectivas compartilhadas e o entendimento de que estão em uma jornada para que continuem quebrando barreiras e sejam autênticos. 

“Para a comunidade LGBTQIA +, a família escolhida é particularmente sagrada. Fazer parte de uma significa que você demonstrou um parentesco colaborativo que permite sentir-se seguro, respeitado, compreendido e cuidado. Mas, acima de tudo, vocês trazem alegria um ao outro.”

Para a comunidade LGBTQIA +, tanto o convívio social quanto o familiar são frequentemente fatores prejudiciais, em função do preconceito e de violências (verbal, moral, psicológica e física) que sofrem, como os dados abaixo confirmam:

  • Para muitas pessoas LGBT+, a exclusão da família de origem implica na construção de novas estruturas familiares que exerçam este fundamental papel em suas vidas. Perder acesso à sua rede de apoio significa a falta de ambientes seguros para serem quem são. A rede de amigos é muito importante para estas pessoas que, muitas vezes, não encontram amparo na família. Espaços como universidades e ambientes de convívio social são muito mais do que lugares de estudo ou lazer. Significam ambientes onde podem sentir-se inteiros e seguros, física e emocionalmente (Box1824).
  • Apenas 37% dos jovens identificaram o lar ou a escola como um espaço de afirmação LGBTQIA+ (The Trevor Project: National Survey on LGBTQ Youth Mental Health, 2022). 
  • O conflito familiar em torno das identidades LGBTQIA+ é um fator importante, acarretando falta de moradia e instabilidade habitacional dos jovens (The Trevor Project: Homelessness and Housing Instability Among LGBTQ Youth, 2020). 
  • De acordo com a pesquisa realizada pelo Center for Talent Innovation, 61% dos funcionários gays e lésbicas decidem esconder sua sexualidade de gestores e colegas em virtude do medo de perderem o emprego. E 33% das empresas do Brasil não contratariam para cargos de chefia pessoas LGBTQIA+. 41% das pessoas LGBTQIA+ afirmam terem sofrido algum tipo de discriminação em razão da sua orientação sexual ou identidade de gênero no ambiente de trabalho.  
  • A legislação brasileira é omissa em relação à dupla licença-maternidade porque não prevê especificidades para uma família cuja criança foi gerada por duas mulheres. A falta de um entendimento uniforme sobre o assunto, quando se trata de filhos biológicos de famílias homoafetivas, abre espaço para que as empresas não validem licenças-maternidade de mães não gestantes. (@agenciapublica)

A criatividade pode validar valores regenerativos (amor), mostrando  que  os ambientes inclusivos são aqueles em que os indivíduos são apreciados por suas características únicas sem preconceitos e, portanto, compartilham os seus pontos de vista e outros aspectos do seu eu verdadeiro e autêntico sem medo. São apresentadas histórias sem filtros, em uma nova leitura sobre o significado  de constituição familiar, sem laço sanguíneo, mas formada por pessoas que permitem sentir-se seguras, respeitadas, compreendidas e cuidadas. Além disso, a marca reverteu parte dos lucros para a Casa Chama, espaço de articulação política e cultural para afirmação da existência dos corpos transvestigêneres. 

Autora:

Daniela Jacques – Fundadora da Poesis.

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