Por Daniela Maciel Em 26 de abril de 2022
Sem grandes referências de lideranças femininas durante a juventude, ela chega ao cargo de CEO do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB) certa do desafio que vai enfrentar como a primeira mulher a liderar a instituição no Brasil e também a primeira entre os Chapters Internacionais (líderes fora dos Estados Unidos). E mais do que isso, do seu papel de inspiradora na construção de novas lideranças não só femininas no Brasil.
Daniela Garcia assume a presidência do Instituto em meio a outras mudanças dentro do ICCB, como a extinção da diretoria de Educação e a criação de uma vertical de Liderança & Educação dentro do Comitê Executivo. Graziela Merlina, ex-diretora de educação, passa a integrar o comitê e também segue compondo o Conselho Estatutário ao lado do Hugo Bethlem, Ari Andrade e Ricardo Glass.
Disposta a construir o raciocínio em conjunto de dona de um otimismo responsável e um sorriso franco, ela conversou com o DIÁRIO DO COMÉRCIO sobre os desafios dessa nova empreitada à frente da instituição, os rumos do capitalismo no mundo pós-pandemia e impactado pela guerra na Ucrânia, e as oportunidades do Brasil em uma nova economia global mais responsável que parece surgir.
Você chega ao cargo de CEO do Instituto Capitalismo Consciente Brasil depois de comandar a diretoria de operações. Qual o significado dessa nova empreitada, que deve durar dois anos, e os primeiros desafios?
Em primeiro lugar, isso se deve a um processo de governança do próprio Instituto. Estamos profissionalizando a estrutura do ICCB. Fizemos um projeto de governança na gestão do Dario Neto. Queríamos alcançar a entrega total. O ESG que pregamos começa com o G de governança. Até então, a sucessão era por indicação com a anuência do conselho. Passei por um processo grande de seleção. Assim podemos falar porque também fazemos.
E quando assumo, o meu olhar é concretizar aquilo que já construímos. Alguns pontos são importantes: a gente abre associações para 4 mil pessoas físicas. Quero concretizar a jornada delas. Quero estar próxima das 11 filiais que abrimos. Falo de Capitalismo Consciente para todas as empresas, de todos os nichos e portes. Elas precisam saber que isso faz parte do negócio. É nossa forma de entregar concretude.
Qual o significado de uma mulher como você assumir a liderança do ICCB nos dias de hoje, em que pese o gigantesco abismo da desigualdade de gênero que enfrentamos no Brasil?
É uma enorme responsabilidade e uma grande honra. Começando pela segunda, honra porque se trata de uma instituição internacional que me elege para falar com o mercado. É uma responsabilidade pelo mesmo motivo, temos como bandeira o papel social das empresas em olhar sobre as dores da sociedade e atuar fortemente sobre elas. É uma responsabilidade também porque tem outras mulheres olhando para mim e isso pode gerar para elas um modelo. Sou uma pessoa comum, classe média, com pais que vieram do interior. Fiz faculdade de segunda linha, trabalhei muito como funcionária e como autônoma também. Mãe de dois filhos, vivi a tripla jornada, as agruras da classe média, da executiva que precisava estudar. Como jovem nas décadas de 1980/1990, tive pouquíssimas lideranças femininas como exemplo. As que se sobressaíam tinham que adotar uma conduta masculinizada. Sou da geração que não tinha politicamente correto. Quero mostrar que tudo isso me trouxe até aqui, mas não sou o terno e a ombreira daquela época. Sou aquela que pode entregar equilíbrio, acolhimento e fazer com que o mantra do ‘Capitalismo Consciente para todos’ seja o mantra do acolhimento. As empresas precisam devolver para a sociedade o que ganha dela. Se ela tem cliente porque a sociedade consome. A liderança feminina é uma jornada árdua, mas possível e gratificante.
Estamos à beira de uma estagflação. Como falar de Capitalismo Consciente nesse cenário?
Sou uma otimista de plantão. O Capitalismo Consciente surge de uma pesquisa que mostrava quais as empresas que conseguiam reter os clientes. Em 2007, na crise do subprime, as empresas mais humanizadas foram as que se saíram melhor. Em tempos de crise gastamos nosso dinheiro de quem nos trata bem. Nesse aspecto verificamos a mesma coisa agora. Durante a pandemia, o capitalismo de stakeholders se fez presente. Se as empresas recuarem, vão desqualificar essa relação. Ao mesmo tempo, consumidores e colaboradores também passaram a olhar as empresas pelo alinhamento de valores. Querem estar próximos de empresas que falem a verdade. Isso é cada vez mais evidente. Não tem caminho de volta, acho que o cerco vai apertar. No Brasil, o ESG tem, obviamente, um foco muito grande em diversidade e inclusão pela própria formação do nosso povo. Então o momento econômico é delicado, mas não temos como voltar.
Toda grande mudança de mentalidade traz em si a resistência. Quais os principais riscos ou pedras nesse caminho?
A gente vê as resistências quando observa poucas mudanças ou pessoas muito rígidas. O mundo dos negócios hoje pressupõe autonomia e flexibilidade em prol da criatividade e inovação. O erro é fundamental para que a gente consiga crescer. A resistência tem a ver com receio, estagnação e a aversão ao risco, o que não é adequado ao mundo de hoje.
Nesse cenário global em que tudo é incerto, quais são os desafios / oportunidades específicas do Brasil?
Esse é um momento em que o Brasil pode assumir um papel protagonista especialmente no que diz respeito à gestão e responsabilidade ambiental. Isso depende de um governo que deixe a iniciativa privada segura, de empresas que trabalhem orientadas para as regiões, incluindo as pessoas, criando uma cadeia de valor por lá. A iniciativa privada tem um grande papel na luta para diminuir as desigualdades no País. O mundo olha pra gente como esse protagonista em potencial. Por causa da guerra na Ucrânia, a OMC (Organização Mundial do Comércio) pediu ao governo federal para aumentar a exportação de alimentos (que fazem parte de estoques reguladores) para equilibrar o abastecimento do planeta, por exemplo. Para assumir esse espaço tão importante no mundo, precisamos de líderes conscientes, orientados para a ação.