Um dos sintomas persistentes do pós-Covid é o apego ao home office. De um lado, empresas oferecem brindes, presentes, bolos e festinhas, na expectativa de que seus funcionários voltem a ocupar fisicamente os escritórios vazios. Do outro, quem não quer abandonar suas pantufas e, menos ainda, vincular a sua carteira de trabalho a um determinado CEP.
Muitas empresas estão tendo dificuldades em lidar com essa nova cultura: o desapego das pessoas em relação ao local físico e estático de seus empregos.
Se muda na sociedade, muda também lá na “firma”
A cultura de uma organização é formada pelo conjunto de crenças, comportamentos e valores das pessoas que atuam nela. Logicamente, elas são atraídas por um determinado tipo de comportamento, ritos, normas, “jeitinho” do funcionamento dos líderes e de outras pessoas que já estão lá há mais tempo. Aparecendo ou não nos manuais internos, toda empresa tem uma cultura. Horas ela pode ser mais definida, horas apenas vivida. Dentro dela, está o famoso “aqui sempre foi assim”.
E claro, a cultura organizacional é um reflexo da sociedade em que vivemos. Cada empresa é uma pequena representação dos nossos espectros sociais. Alguns episódios trazem um grande impacto na nossa cultura e interferem na forma como as pessoas se relacionam, com as suas expectativas e visões de mundo. E isso também se reflete nas organizações.
Perpetuação
Apesar de as empresas poderem também ter um ciclo de vida: concepção, nascimento, crescimento, amadurecimento e morte, diferentemente dos seres humanos, elas não precisam perecer ao declínio físico. Elas podem transcender no tempo se os problemas ligados à sua essência forem tratados com sabedoria.
A atualização da identidade organizacional é um ponto de atenção importante. Não só para se manter relevante para o mercado, mas também da porta para dentro.
“Está cada vez mais claro que, para se ter sucesso profissional individualmente no século XXI, ou coletivamente, da forma de uma organização, você precisa se diferenciar não por aquilo que você faz, mas por quem você é e como você faz o que faz.” – Richard Barrett
Identificando a Cultura interna
Mesmo que a cultura interna seja um reflexo da sociedade, isso não significa que toda organização deve adotar a bandeira de algo que seja oposto a seus princípios. Existe a adequação e o respeito ao entendimento das mudanças globais, mas é importante ter reconhecimento dos valores internos, do que é inegociável, daquilo que é autêntico e faz parte da essência e identidade de cada organização. Uma empresa que tem como valor o respeito, não vai se opor a buscar equidade na contratação racial e de gênero, por exemplo. Ela apenas precisa atualizar sua visão sobre o que significa “respeito” no momento atual.
A cultura precisa expressar o que a empresa é, faz e fala. Ela não pode ser sustentada apenas pelo prego da placa na parede da recepção. As crenças e valores podem ser velados, mas os comportamentos são visíveis.
Atraindo pela cultura
Nem todas as empresas conseguem atender essa necessidade de liberdade que as pessoas do home office buscam. Mas se ela souber com clareza qual a sua cultura interna, e entender que a flexibilidade, a autonomia e o protagonismo fazem parte de seus valores, talvez consiga atrair talentos ou oferecer desafios que sejam interessantes para um bom número deles.
O que não é medido não pode ser avaliado. Uma das alternativas para olhar para a cultura interna é a metodologia da BVC — identificar os valores atuais percebidos na organização, o conjunto dos indivíduos e os desejados.
Assessments são uma excelente ferramenta, mas a simples reflexão entre as principais lideranças são um bom termômetro para gerar alinhamento, tomada de consciência desses valores e escolha de quais valores desejados fazem sentido.
Entender a cultura é um processo de autoconhecimento. É preciso olhar para dentro, ter essa coragem como líder, olhar para meus pares, ver como funcionam em grupo; abrir essas gavetinhas. Entender o que é importante para cada um deles, como indivíduo, o que é importante para essa liderança e para o futuro da organização
Assim será possível atuar e definir um padrão de comportamentos que serão capazes de disseminar uma cultura interna que gera entusiasmo e orgulho.
Stela Nesello é Sócia-fundadora da Laborama Cultura Organizacional e da Agência Incomum.
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